domingo, 24 de janeiro de 2010

Vivo pra contar





Alguém disse que a vida é uma escola. Estou pensando em aproveitar a hora do recreio pra inventar histórias. Sempre fui fascinada pelas palavras e nada melhor que a hora do lanche pra observar o mundo. Olhos famintos são os meus. Mas é que o mundo tem sempre um bom motivo pra nos mostrar o essencial. Todo mundo tem esse poder. Não há receita ou medida exata para refazer e achar a expressão mais simples do que a vida nos apresenta. Não vale perder a cena seguinte. Misturo tudo e o texto quase me chama. Sinto que vou achar todas as palavras para as caras alegres das crianças que encontro pelo caminho, perceber o tanto que falta para acabar com a sisudez de quem se esqueceu de viver, rir junto com tantos outros que sabem viver, descobri a melancolia dentro das canções e perceber que nem precisam ser iguais as minhas, tentar desvendar os risos nas entrelinhas de tantas outras para que o texto possa fluir mais fácil.
E o que dizer das paisagens rápidas vistas pelo vidro do carro em velocidade, do pouso lento do pássaro no telhado do vizinho ou dos estranhos desenhos formados pelas nuvens no final de uma tarde ensolarada. Acho que posso achar a expressão mais simples de contar a vida. Escrevo em parceria com a vida porque gosto dela. Simples assim! Quero viver pra contar a vida.

Aliás, bom mesmo é ouvir a música "Mais Simples de José Miguel Wisnik (músico, compositor, ensaísta brasileiro e também professor de Literatura brasileira da USP), através do Grupo Vocal - 26ª Oficina de Música de Curitiba, com Arranjo e regência de Vicente Ribeiro.



domingo, 17 de janeiro de 2010

Bilhetes


Sinto saudades. Saudades dos seus bilhetes. Saudades de quando as palavras tinham mais sentido. Quando os verbos eram pra conjugar verdades. Quem sabe mentiras para o outro ser mais feliz. Eram bilhetes que chegavam de surpresa. Palavras que chegavam de repente para alimentar o coração. Um coração que só interpretava paixão.

Hoje sinto saudades dos melhores bilhetes que traduziam o melhor dos sentimentos. O que dizer sobre a frase “Agora desejo um beijo e o silêncio da minha boca na tua...” A mensagem batia fundo. Era o bilhete que chegava desvendando todos os desejos do beijo. Como era difícil encontrar uma explicação rápida para um sentimento que durava o tempo exato da emoção. Nem mais, nem menos. As vezes as melhores respostas viam em forma de lágrimas com muitos beijos.

Sinto saudades das mudanças de estação. Cada uma delas era motivo para um bilhete apaixonado. Chegavam para desafiar as previsões. Nunca para adivinhar o que ainda estava por vir. Não eram bilhetes previsíveis. Descobríamos juntos que eram necessários. Com o tempo exato para manter o clima de romance no ar. A Primavera começava no horário certo, às 15h43. Era o exato momento em que a inspiração surgia em forma de verso. Versos como este por exemplo: “ Para os outros a primavera começa hoje, às 15h43. Para mim ela existe desde quando você me polinizou, instaurando vida, cor e perfume em minha vida” Por isso nem queiram imaginar o que significou o Outono para mim. É só disso que sinto saudades. Saudades do que representaram todos os bilhetes.

Mas foi também assim que um dia todas as palavras se foram. Junto com o seu último bilhete não sobrou um verbo para conjugar. Nada sobrou do verbo amar. Erramos a terminação e agora só nos resta flexionar a vida e aprender um pouco mais sobre o que significa reler todos esses bilhetes que nos fazem sentir saudades.


(Inspirado no Bilhete de Noel Rosa postado para ilustrar o texto)